terça-feira, 18 de novembro de 2008

Mulher do ano

Nojood Mohammed Ali, de dez anos, viajou de Sanaa, capital do Iémen, até New York para receber o prémio de uma das dez Women of the Year 2008 por ter aberto o caminho às meninas que querem libertar-se de casamentos forçados.
Nojood filha de um desempregado que antes recolhia lixo nas ruas teve o mesmo destino que as suas irmãs. Contra a vontade, foi retirada da escola pelo pai para arranjar um marido, o carteiro Faiz Ali Thamer de 30 anos.
Ela frequentava a segunda classe e adorava estudar Matemática e o Corão.
No dia do casamento, confiante noutra promessa de que a união não seria consumada antes de ela "ser adulta", a menina ficou fascinada com o dote: três vestidos, um perfume, duas escovas do cabelo, dois hijab (véu islâmico) e um anel cujo preço equivalia a 20 dólares. Este anel foi logo vendido pelo recem-marido, que comprou roupas para si próprio. A partir dali, a vida da recém-casada só piorou.
"Eu corria de sala em sala para tentar fugir, mas ele acabava sempre por me apanhar". "Chorei tanto, mas ninguém me ouvia. Sempre que eu queria brincar no pátio, ele vinha, batia-me e obrigava-me a ir para o quarto com ele. E se seu pedia misericórdia ainda batia e abusava mais de mim. Eu só queria ter uma vida respeitável. Um dia fugi."
E esse dia foi 2 de Abril deste ano, dois meses após o casamento. Sob o pretexto de ir visitar a sua irmã favorita, Haifa (que aos nove anos vende pastilhas na rua), seguiu o conselho da "tia" (a segunda mulher do pai) e foi procurar justiça. Esta mendiga que ocupa um quarto com os seus cinco filhos foi a única que a tentou ajudar.
Nojood apanhou primeiro um autocarro e depois um táxi e foi até a um tribunal de Sanaa. Ela era tão pequenina, que quase passou despercebida aos magistrados, aos advogados e a outros funcionários. À hora de almoço, quando a multidão se dispersava, um juiz curioso aproximou-se dela e perguntou-lhe o que fazia sentada num dos bancos. A resposta foi: "Eu vim pedir o divórcio." Mohammed al-Qadhi, o juiz, ficou comovido.
O tribunal estava quase a fechar, e ele levou-a para casa dele. No sábado seguinte, ele mandou deter o marido e o pai. Foi então que eu apareceu Shada Nasser, advogada que se ofereceu para a representar.
Nasser ficou intrigada por Nojood ter recusado ir para um lar de acolhimento e ter preferido voltar à casa paterna, mas nunca mais a abandonou. Quando o veredicto chegou - dissolução do casamento -, a notícia espalhou-se pelo Iémen e pelo resto do mundo.
No Iémen, segundo um estudo da Universidade de Sanaa, cerca de 52 por cento das raparigas são forçadas a casar-se antes dos 18 anos.
Os islamistas do Comité da Sharia [lei corânica] recusam impor limites, mas há um grande movimento da sociedade civil para que o Parlamento aprove este mês uma lei que imponha os 18 anos como idade mínima. Vai haver compromisso, para os 16 anos.
Nojood está feliz. "A minha vida é doce como um rebuçado". Regressou à escola. Quer ser advogada. "Para proteger outras meninas como eu."

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